sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Sefer D’varim (Livro Deuteronômio).

Por Yochanan ben Avraham.

Introdução.

Chegamos ao último livro da Torah, e para iniciarmos os estudos e comentários de seu conteúdo faremos uma breve apresentação deste livro que, sem exageros, pode ser considerado o mais importante da Torah! Esta afirmativa se deve ao sentido claro de suas palavras acerca de como deve ser o relacionamento com O Eterno.
A ratificação do monoteísmo e o caráter do Eterno em relação a Sua Palavra; a afirmação da essencialidade do amor como base da “religião” (Serviço ao Eterno) e nas relações humanas e a definição das condições para ser parte integrante do povo de Adonai, (Israel), fazem deste livro uma obra magistral de fundamental importância para aqueles que pretendem trilhar O Caminho para a Vida.

O título do Livro.

Em hebraico este livro chama-se “D’varim”, que significa “Palavras”. Na Septuaginta (LXX), a conhecida versão grega do Tanach (Chamado de Velho Testamento pelos cristãos) ele foi denominado como “Deuteronômio”, que significa “segunda Lei” ou “Repetição da Lei”. Porém, a denominação grega para o livro, acaba indiretamente induzindo o leitor a um erro, pois o conteúdo de D’varim não é necessariamente uma repetição do que já havia sido dito nos demais livros, veja o quadro abaixo:

                Livros
   Repetição em D’varim
    Omitido em D’varim
Bereshit (Gênesis)
Quase nada
Criação, Dilúvio, Yosef e seus irmãos.
Shemot  (Êxodo)
Poucos detalhes do Êxodo; a revelação do Sinai; o pecado do bezerro de ouro
Mishkan (santuário móvel/Tabernáculo)
Vayikrá (Levítico)
Quase nada
Quase todas as mitzvot (mandamentos)
Bamidbar (Números)
Os espias; a derrota de Sichon & Og
Quase todas as mitzvot (mandamentos)

Como demonstrado, o sefer D’varim não é uma mera repetição, além do mais, contém mandamentos que não foram mencionados em nenhuma outra parte da Torah.

O tema do livro.

D’varim começa a se destacar dos demais, quando percebemos ao longo de todo seu texto a unidade de estilo e linguagem. Em comparação com os outros quatro livros, onde as histórias e mandamentos são apresentados na terceira pessoa, o sefer D’varim é quase todo escrito em primeira pessoa. Esta particularidade indica que o livro é uma coletânea de discursos sob o tema: “obediência e manutenção da Torah”.
Entendemos então que D’varim é como se fosse o ponto de partida para a “Nação israelita”, pois sintetizava em seu conteúdo tudo o que definia e representava ser um israelita, ou seja, a omissão de vários aspectos importantes da história dos hebreus pode significar que todos já conheciam as origens e o chamado do povo, e que naquele momento se iniciava uma nova etapa, onde a identidade israelita estava sendo definida e santificada. É esta definição contida em D’varim que nos leva a compreender porque muitos o consideram como aquilo que salvou o povo na diáspora, já que seu valor é mais do que literário, é moral.
O que também nos salta aos olhos é o forte apelo para as relações humanas. De fato, a geração que estava recebendo aquelas palavras, não era mais a mesma, pois com exceção de Yehoshua e Kaleb, ninguém da geração anterior entraria na terra prometida. Foi uma geração que NÃO cresceu no cativeiro de faraó numa terra infestada de idolatria, mas sob a liderança de Moshe, conhecendo o poder e a vitória decorrentes da confiança em Adonai. Estas características indicam que o povo tinha um nível de consciência religiosa bem definida, porém, é possível que, no que diz respeito às relações sociais, muitas coisas precisariam ser “ajeitadas” e é com este “background” que se entende a instituição de diversas leis com a finalidade de organizar a sociedade israelita em relação ao seu cotidiano e também nas celebrações estabelecidas pela Torah, como vemos nos capítulos 14 e 16, por exemplo.
O crescimento do povo longe da idolatria do Egito e a separação dos povos cananeus, podem ter causado um “efeito colateral” nos filhos de Israel, a hipocrisia e a xenofobia. Contra estes males D’varim preveniu da seguinte forma:

“Circuncidai, pois, o prepúcio do vosso coração, e não mais endureçais a vossa cerviz. Pois YHWH vosso Elohim é Elohei dos deuses, e o Senhor dos senhores, o El grande, poderoso e terrível, que não faz acepção de pessoas, nem aceita recompensas;
Que faz justiça ao órfão e à viúva, e ama o estrangeiro, dando-lhe pão e roupa. Por isso amareis o estrangeiro, pois fostes estrangeiros na terra do Egito.”

(D’varim/Deuteronômio 10.16-19)

A autoria do Livro.

As discussões entre críticos e acadêmicos sobre a autoria de D’varim, fornecem dados interessantes para análises, contudo, por questões de brevidade, não iremos abordar todas as questões, mas apenas um breve resumo daquilo que consideramos mais relevante para o momento.
Até época recente, alguns críticos afirmavam que D’varim havia sido escrito no tempo de Yoshiyahu (Josias) por volta do ano 621 a.C. isto se deve, provavelmente, por causa do idioma e estilo e também por um “evidente” parentesco com Yermiyahu (Jeremias) e o autor do Sefer Melachim (Livro de Reis) tanto pela forma quanto pela retórica. Contudo, a unidade de pensamento encontrada no livro e citações encontradas nele próprio (capítulo 31.9, 24-26), apontam para Moshe como o autor.
Uma provável solução para o impasse sobre a autoria poderia ser sugerida a partir do pensamento de que um texto original foi encontrado no período do reinado de Yoshiyahu (Josias), já que a reforma implantada por este após a descoberta do sacerdote Chilkiyahu (Hilkias) do livro da Lei perdido no Templo (ver Melachim beit / II Reis 22. 8-30), apresenta muitos pontos de contato com o sefer D’varim, mas recebeu acréscimos no decorrer do tempo. De fato, o último capítulo sobre a morte de Moshe é compreendida como um apêndice posterior, escrito talvez por Yehoshua (Josué), El’azar (Eleazar) ou mesmo Sh’muel (Samuel).
De qualquer forma, mesmo diante de todas as teorias e especulações sobre a autoria destes escritos, nossa opinião é de que Moshe foi e o grande responsável pela codificação e registro da Lei, e como iniciador religioso e primeiro legislador ele deve ser considerado o autor desta obra, mesmo que a mudança dos tempos e condições sociais do povo israelita exigisse algumas adaptações de sua forma original.
Corroborando com a autoria de Moshe, temos alguns relatos da B’rit Chadashah (Chamado de Novo testamento pelos cristãos):

Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la? Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim.
(Matitiyahu/Mateus 19.7-8)

Porque a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Yeshua HaMashiach.
(Yochanan/João 1.17)

Porque, se vós crêsseis em Moisés, creríeis em mim; porque de mim escreveu ele.
Mas, se não credes nos seus escritos, como crereis nas minhas palavras?
(Yochanan/João 5.46-47)

Porque Moisés disse aos pais: YHWH vosso Elohim levantará de entre vossos irmãos um profeta semelhante a mim; a ele ouvireis em tudo quanto vos disser.
(Ma’assei/Atos 3.22)

Ora, Moisés descreve a justiça que é pela lei, dizendo: O homem que fizer estas coisas viverá por elas.
(Ruhomayah/Romanos 10.5)

Porque na lei de Moisés está escrito: Não atarás a boca ao boi que trilha o grão. Porventura tem O Eterno cuidado dos bois?
(Curintayah alef/1 Coríntios 9.9)

Portanto, citando Mishlei (Provérbios) 22.28, entendemos que devemos manter a tradição da autoria mosaica dos textos não só de D’varim, mas de toda Torah:

“Não removas os antigos limites que teus pais fizeram”

Curiosidades do Sefer D’varim.

  • É o livro com maior número de questões de relacionamento humano do que qualquer outro livro da Bíblia.
  • É citado 356 vezes por escritores posteriores do Tanach e mais de 190 vezes pela Brit Chadashah.
  • Foi o livro mais citado por Rabi Yeshua.
  • Enfatiza o amor de YHWH por Israel 5 vezes.
  • Enfatiza a necessidade de o homem amar ao Eterno 12 vezes.

Concluindo...

Este pequeno artigo buscou trazer uma base para o início dos estudos do Sefer D’varim, como pode ser observado, não esgota todas as discussões sobre o mesmo, apenas inicia o assunto para que de “Shabat a Shabat”, construa-se o conhecimento necessário para prosseguirmos nossa jornada e, se alguém quiser utilizar o nome dado pela septuaginta, Deuteronômio, que se entenda que a repetição não é a da Lei, mas deve ser a da prática dos mandamentos contidos neste livro.

Referências:

“A Lei de Moisés” Torá – Editora e Livraria Sêfer LTDA, 2001
“Conheça Melhor o Antigo Testamento”. Stanley A. Ellisen- Ed. Vida
Tanach Study Center”. Menachem Leibtag - http://www.tanach.org/
“Dicionário Bíblico”. John L. Mackenzie – Edições Paulinas. 1984

Shabat Shalom!!!


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