Por Yochanan ben Avraham
Introdução.
Neste Shabat, apesar de lermos apenas um perek (capítulo),
temos inúmeras lições a serem aprendidas, pois ao longo dos 41 passukim
(versículos) desta sedrá, diversas instruções são transmitidas no intuito de
moldar o caráter do povo para a entrada na terra prometida. Leis sobre
sacrifícios e ofertas para serem feitos em Erets Israel (Terra
de Israel); inclusão dos estrangeiros; transgressões comunais e individuais e
seus respectivos ritos expiatórios; transgressões involuntárias, por ignorância
e transgressões propositais; profanação do Shabat e sua conseqüência e,
finalmente, a mitsvá (mandamento) do “tsitsit” (franjas utilizadas nas vestes).
Todas estas situações são amplamente comentadas e diversas aplicações foram
feitas no decorrer dos séculos, contudo, é através da repetição, do
inculcamento destas palavras, que poderemos alcançar um nível de entendimento
que nos levará além da mera verbalização destes preceitos.
Um lugar especial.
Nos primeiros 21 passukim (versículos), O Eterno recomenda
uma série de ritos para serem executados quando os hebreus adentrarem a terra
prometida. Isto, por si só, já demonstra que o lugar que o povo passaria a
habitar não era comum, pois a especificidade ritualística para a ocasião
expressa nas palavras: “Quando tiverdes entrado na terra...” não deixa dúvidas
quanto a isso.
As recomendações dadas sugerem duas coisas muito importantes
para a continuidade do povo hebreu. A primeira nos fala de uma esperança
nacional reavivada, porque o momento que o povo estava vivendo, era um momento
traumático, pois eles haviam ouvido uma dura sentença por parte do Eterno por
causa do relato difamatório dos dez espias, por isso, sabe-se lá qual eram os temores
que passaram a habitar seus corações, já que “líderes” não haviam sido poupados,
o que poderia então acontecer com eles? Será que o povo, pela sua inconstância, seria
exterminado antes de chegar a Kena’an? Não podemos afirmar... Mas seja qual for
o estado de espírito dos hebreus, O Eterno, ao instruir sobre rituais para
serem executados quando entrarem na terra estava garantindo que a promessa
seria cumprida, renovando, por assim dizer, a esperança nacional de um lugar
para se estabelecerem e viverem livremente. Isto é um indício de que sempre
haverá um remanescente de Israel.
Em segundo lugar, ao especificar mandamentos para serem
cumpridos em “Erets Israel”
(Terra de Israel), percebemos que, no mínimo, esta terra
seria diferente de todos os lugares que o povo já havia percorrido. De fato, a
leitura dos profetas demonstra isso com clareza, esta diferença seria a
santidade. Ao dizermos santidade, não estamos dizendo que seria algo etéreo, de
caráter simbólico apenas, de outra forma, os mandamentos não seriam tão
específicos quanto ao local para serem executados. Sim, o local tem total
relevância, como podemos constatar nas palavras de Yeshayahu /Isaías:
“Palavra que viu Isaías, filho de Amós, a respeito de Judá e de
Jerusalém.
E acontecerá nos últimos dias que se firmará o monte da casa do SENHOR
no cume dos montes, e se elevará por cima dos outeiros; e concorrerão a ele
todas as nações.
E irão muitos povos, e dirão: Vinde, subamos ao monte do SENHOR, à casa
do Deus de Jacó, para que nos ensine os seus caminhos, e andemos nas suas
veredas; porque de Sião sairá a lei, e de Jerusalém a palavra do SENHOR.” (Yeshayahu/Isaías 2.1-3)
Israel representa o Reino de YHWH, é a embaixada do "Malchut Hashamaim" (Reino dos Céus) na terra e desde os primórdios têm sido preparada para isso, por isso dizemos: É uma Terra Santa.
Quem são os estrangeiros?
A Torah proíbe terminantemente que algum ‘estrangeiro’, seja
tratado com distinção. Contudo, é preciso esclarecer algumas coisas em relação
a isso, pois a palavra utilizada para estrangeiro nesta passagem é “גר” (Guer)
e não “גוי”
(Goy) ou “נכר”
(Nekar).
Guer, em
poucas palavras, é alguém que aceitou os preceitos de Adonay e passou a
caminhar com (e como) os israelitas, podemos chamá-lo de “prosélito”. Goy por sua vez, é um termo
direcionado especialmente para referir-se a grupos de pessoas em seu aspecto
político, étnico ou territorial, sem objetivo de atribuir a tais pessoas uma
conotação religiosa ou moral específica. (DITAT,
pg 252), Ou seja, outro povo, separado tanto ideologicamente quanto
territorialmente de Israel. Nekar
geralmente é traduzido por “estranho” ou “estrangeiro”. Corroborando com isso
temos Shemot/Êxodo 22.20:
“O estrangeiro (Guer) não afligirás, nem o oprimirás; pois estrangeiros
(Guerim) fostes na terra do Egito.”
Após entendermos a diferença dos termos, é importante dizer
que aqueles que reivindicam ter Avraham (Abraão) como pai, devem manter o pacto
que ele fez. Ninguém é filho de Abraão só por dizer, mas devem andar como ele
andou e para saber como foi isso basta lermos Bereshit 26.5:
“Porquanto Abraão obedeceu à minha voz, e guardou o meu mandado, os
meus preceitos, os meus estatutos, e as minhas leis.”
Se você é estrangeiro e despreza o Shabat, Brit Milah
(circuncisão) os Moedim (Festas da Torah), a kashrut (leis alimentares) e
outros mandamentos da Torah, você não é um “guer”, pois não está andando como
um filho de Avraham. Mas se desejas ser acolhido pelo Elohim de Avraham e estar
sob a tenda de nosso Patriarca saiba que:
E não fale o filho do estrangeiro (nekar), que se houver unido ao
SENHOR, dizendo: Certamente o SENHOR me separará do seu povo; nem tampouco diga
o eunuco: Eis que sou uma árvore seca. Porque assim diz o SENHOR a respeito dos
eunucos, que guardam os meus sábados, e escolhem aquilo em que eu me agrado, e
abraçam a minha aliança:
“Também lhes darei na minha casa e dentro dos meus muros um lugar e um
nome, melhor do que o de filhos e filhas; um nome eterno darei a cada um deles,
que nunca se apagará. E aos filhos dos estrangeiros (Nekar), que se unirem ao
SENHOR, para o servirem, e para amarem o nome do SENHOR, e para serem seus
servos, todos os que guardarem o sábado, não o profanando, e os que abraçarem a
minha aliança, também os levarei ao meu santo monte, e os alegrarei na minha
casa de oração; os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no meu
altar; porque a minha casa será chamada casa de oração para todos os povos.”
(Yeshayahu/Isaías 56.3-7)
“Pecadinho” e “Pecadão”?
Quantos de nós já ouvimos a expressão: não existe
“pecadinho” ou “pecadão”... Pecado é pecado! Ao lermos a Torah, a impressão que
temos é outra, podemos sim diferenciar os pecados cometidos. O texto é claro na
distinção destes, vejamos:
Pecado por
inadvertência.
Comunidade:
Oferecerá um novilho como oferta de elevação e um cabrito pelo pecado.
Individuo:
Sacrificará uma cabra de um ano.
Pecado deliberado ou
proposital.
Não há sacrifício para remissão deste, a pena é a morte.
Se o povo não foi advertido pelos seus líderes e, por
ignorância cometer um delito, há esperança para remissão deste. Já para aquele
que faz parte do povo, mesmo sabendo que o que faz é errado e continua no delito...
Deve ser banido, pois tal indivíduo despreza a palavra de YHWH.
Alguns entendem que o banimento da alma que peca
deliberadamente, é algo espiritual. Sendo assim, o princípio permanece e textos
do chamado Novo testamento demonstra que a comunidade dos seguidores de Yeshua
nos primeiros séculos não aboliu este aspecto da Lei, mas compreendia
exatamente como proposto acima, vejamos alguns:
“Porque, se pecarmos voluntariamente, depois de termos recebido o
conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados. Mas certa
expectação horrível de juízo, e ardor de fogo, que há de devorar os
adversários.” (Ivrim/Hebreus 10.26-27)
“Se alguém vir pecar seu irmão, pecado que não é para morte, orará, e O
Eterno dará a vida àqueles que não pecarem para morte. Há pecado para morte,
e por esse não digo que ore. (Yochanan
alef/1 João 5.16)
A santidade do Shabat
Muito já se escreveu sobre o Shabat, e muito ainda se
escreverá. Muitos de nós já lemos diversos ensinamentos sobre a importância de
observarmos este dia, mas impressão que temos é que pouco se entendeu.
Ao lermos que um homem foi morto por não guardar o Shabat,
isso deveria nos levar a uma profunda reflexão: Por que é tão grave quebrar um
Shabat, o que há de tão especial neste dia para que O Eterno sentenciasse
alguém a uma morte tão dolorida?
Primeiramente, o homem que foi morto estava enquadrado no
que a Torah, alguns passukim (versículos) acima descreveu: Ele pecou
deliberadamente, desprezando o mandamento do Eterno. Em segundo lugar, como
dissemos na introdução desta Sedrá, O Eterno estava moldando o caráter do povo,
e a advertência foi exemplar.
É preciso entender que a Torah enfatiza a ética e o ritual e
como disse Aryeh Kaplam:
“Todos nós podemos
entender a importância das leis éticas do judaísmo. Nenhum de nós tem
dificuldade em compreender porque a Torah nos proíbe matar ou roubar ou porque
não devemos ofender ou ferir outra pessoa”. E em relação aos rituais, seu objetivo está no
fortalecimento do relacionamento com O Eterno, é no Shabat que estas duas
vertentes se encontram e por questões de brevidade, não abordaremos tudo o que
isso envolve, mas sintetizar em algumas palavras a idéia deste conceito.
A guarda do Shabat é o único mandamento iniciado com a
frase: “Lembra-te”, (talvez porque O Eterno já sabia que os homens
esqueceriam), em Shemot/Êxodo 20, temos uma associação do Shabat com a criação,
de fato, se os homens observassem o shabat dificilmente haveria ateus, pois ao
se perguntar o porquê de observarmos tal dia, uma criança ouviria: “Porque O
Eterno criou todas as coisas em seis dias e no sétimo descansou...” Logo, é uma
questão de crença e não apenas de descanso.
Em D’varim /Deuteronômio 5 O Shabat têm seu propósito
ampliado, pois ele é associado a saída do Egito, portanto, está ligado aos
milagres, a libertação, a peregrinação e sustento no deserto. Profanar o Shabat
é abdicar da nossa identidade como povo de YHWH, pois este dia é o sinal entre
nós e o Altíssimo:
“Tu, pois, fala aos filhos de Israel, dizendo: Certamente guardareis
meus sábados; porquanto isso é um sinal entre mim e vós nas vossas gerações;
para que saibais que eu sou o SENHOR, que vos santifica.
Entre mim e os filhos de Israel será um sinal para sempre; porque em
seis dias fez o SENHOR os céus e a terra, e ao sétimo dia descansou, e
restaurou-se.”
(Shemot/Êxodo 31.13, 17)
Não faça tudo o que vier na cabeça!
O final deste capítulo traz um mandamento muito
interessante, a ordem sobre a confecção de franjas (ou cordas trançadas) que
contenham um fio azul para serem presas as vestes dos hebreus. Este assunto já
rendeu muitas discussões sobre qual a tonalidade do azul a ser utilizada,
tamanho das franjas (ou cordas), a que tipo de vestimenta deve ser aplicada e
etc., embora tais discussões possam ter algum valor, percebe-se que o real
propósito do mandamento por vezes é esquecido. O intuito das franjas é:
“E as franjas vos serão para que, vendo-as, vos lembreis de todos os
mandamentos do SENHOR, e os cumprais; e não seguireis o vosso coração, nem após
os vossos olhos, pelos quais andais vos prostituindo.
Para que vos lembreis de todos os meus mandamentos, e os cumprais, e
santos sejais a vosso Elohim. (Bamidbar/Números 15.39-40)
Não devemos atender a todos os impulsos que sentimos, nem
permitir que nossos olhos nos levem a pecar, pois como disse Yeshua ha Notsri:
“Se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso. Se,
portanto, a luz que em ti há são trevas, quão grandes serão tais trevas!”
(Matitiyahu/Mateus 6.23)
Chavah (Eva) e David são exemplos clássicos de pessoas que
“caíram” por causa do que viram, ou melhor, a má intenção de seus corações foi
potencializada pelo olhar, não é por acaso que Sh’lomo escreveu:
“Não olhes para o vinho quando se mostra vermelho, quando resplandece
no copo e se escoa suavemente.” Mishlei/Provérbios 23.3
Shabat Shalom!!!
Nenhum comentário:
Postar um comentário