Por Yochanan ben Avraham
Introdução.
M ais um rico trecho do sefer bamidbar a ser estudado que,
apesar da distância tanto temporal quanto espacial, está repleta de princípios
morais e éticos a serem vivenciados ainda hoje em pleno Século XXI.
Neste perek (capítulo) temos: A luta contra o cananeu rei de Arad; a murmuração
do povo e o ataque das “nachashim haserafim” (serpentes abrasadoras); a
confecção da serpente de bronze e sua exposição no alto de uma haste e as
batalhas contra os emoreus e Og, rei de Bashan.
Resistindo a ganância.
A primeira lição que aprendemos nesta sedrá está logo no
início do capítulo quando vemos Israel lutando contra o cananeu rei de Arad.
Assim como o povo necessitou passar pelas terras de Edom, agora precisaria
atravessar os termos de Arad, o que não foi possível sem que houvesse uma
batalha. E aqui que aprendemos a primeira lição:
Por que O Eterno permitiu que Israel lutasse contra o
cananeu e não permitiu que lutasse contra Edom? Alguns comentaristas afirmam
que isso se deu por causa dos limites estabelecidos pelo próprio YHWH para as
nações:
“Quando o Altíssimo distribuía as
heranças às nações, quando dividia os filhos de Adão uns dos outros,
estabeleceu os termos dos povos, conforme o número dos filhos de Israel.” (D’varim/Deuteronômio
32.8)
Embora esta explicação seja bem plausível e, portanto,
satisfatória, existe outra forma de olhar para esta questão e é nisso que nos
detemos para extrair a lição sugerida, pois quando vemos que Israel conquista
Arad e posteriormente o emoreu (cujo encontro e diálogo foram muito semelhantes
ao que havia ocorrido com Edom) e também a Bashan, aprendemos que nem tudo que
está em nosso caminho deve ser apropriado! Infelizmente, muitos dão ouvidos a
discursos triunfalistas e desenvolvem uma ganância desmedida entendendo que
conquistar tudo o que está diante de si é sinônimo de vida abençoada. Lembremos
do último dos dez ditos:
“Não cobiçarás a mulher do teu próximo; e não desejarás a casa do teu próximo,
nem o seu campo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu
jumento, nem coisa alguma do teu próximo.” (D’varim/Deuteronômio 5.21)
As serpentes abrasadoras
Outro episódio importante neste capítulo é o ataque das
serpentes abrasadoras ao povo, salta-nos aos olhos, o elemento causador deste
ataque, a impaciência do povo. O texto diz claramente que “a alma do povo”
impacientou-se e não simplesmente o povo:
“E partiram do monte Hor, pelo caminho do yam suf, para rodear a terra
de Edom, e impacientou-se a alma do povo no caminho.” (Bamidbar
/Números 21.4)
É Interessante dizer
que o termo aqui utilizado para alma é “Nefesh” que para muitos é o estágio,
digamos, “animalesco” da alma, diferente de “Ruach” (espírito) e neshamah (alma
divina e/ou estágio mais elevado), ou seja, os instintos mais primitivos do
homem (sobrevivência física) norteando as palavras, pensamentos e ações. Quando
isso ocorre, as coisas certamente não terminarão bem como de fato ocorreu com
aqueles que não resistiram ao “yetser hará” (impulso mal).
O que é surpreendente neste episódio, está no valor numérico
das palavras נפש העם
“nefesh haam” (alma do povo) que é 545, o mesmo valor da
palavra “methaleah” (dentes incisivos, mordedores)! Lembremos que por causa de
“suas almas” o povo foi MORDIDO pelas serpentes abrasadoras... Mais uma
constatação do que Sh’lomo (Salomão) escreveu:
“A morte e a vida estão no poder da língua; e aquele que a ama comerá
do seu fruto.” (Mishlei/Provérbios 18.21)
Por ter “mordido” ao Eterno e a Moshe, o povo recebeu em si
o mesmo mal.
Um dado histórico interessante reside nos achados
arqueológicos em
Timna. Diversas pequenas serpentes de cobre, relacionando
esta história com as minas de Arabá, que fica justamente entre Cadesh (local da
morte Miriam) e Ácaba (yam suf).
Olhando para a serpente de “El”.
Outro aspecto curioso deste capítulo foi o meio utilizado
para curar as vítimas das serpentes abrasadoras, está escrito que Moshe fez uma
serpente de cobre e a pôs sobre uma haste para que todo aquele que fosse
mordido, ao olhar para a réplica de metal sobreviveria. O texto original
descreve esta réplica como “El nachash hanechoshet” e não simplesmente “nachash
hanechoshet”. O termo “El” geralmente é utilizado para indicar seres
sobrenaturais e o uso deste está indicando que havia uma diferença, pois
enquanto as “nachash serafim” vieram por causa da maldade dos homens a “El Nachash
HaNechoshet” veio pela misericórdia do Eterno.
Olhar para a serpente, não é a única vez em que olhar para
algo resultaria em salvação e/ou livramento para o povo, vejamos o que disse
Yeshayahu ha navi (Isaías o profeta):
“Olhai para mim, e sereis salvos, vós, todos os termos da terra; porque
eu sou El, e não há outro.”
(Yeshayahu/Isaías 45.22)
Isso fica mais interessante porque ao invés do tetragrama יהוה,
ou os termos comumente utilizados para se referir ao Eterno como Adonay,
Elohim, Elyon e etc, têm justamente “El”! O mesmo utilizado para se referir a
serpente de bronze como podemos contatar:
פנו אלי והושעו
כל אפסי ארץ כי אני אל ואין עוד
Outro aspecto curioso surge quando aplicamos a guemátria
(sistema de cálculo das letras hebraicas) na palavra נחש “nachash” (serpente), que
é de 358 exatamente o mesmo valor da palavra משיח “mashiach”
(ungido/messias)! Extremamente curioso ainda é o fato de que, no futuro, a
serpente de “El” estava sendo objeto de idolatria como podemos verificar:
“E sucedeu que, no terceiro ano de Oséias, filho de Elá, rei de Israel,
começou a reinar Ezequias, filho de Acaz, rei de Judá.
Tinha vinte e cinco anos de idade quando começou a reinar, e vinte e
nove anos reinou em Jerusalém; e era o nome de sua mãe Abi, filha de Zacarias.
E fez o que era reto aos olhos do SENHOR, conforme tudo o que fizera
Davi, seu pai.
Ele tirou os altos, quebrou as estátuas, deitou abaixo os bosques, e
fez em pedaços a serpente de metal que Moisés fizera; porquanto até àquele dia
os filhos de Israel lhe queimavam incenso, e lhe chamaram Neustã.” (Melachim
beit/2 Reis 18.1-4)
O fato da serpente de “El” ter sido um instrumento de
salvação, cura e livramento não fazia dela um objeto de adoração, e SE este
princípio é aplicável ao equivalente “guemátrico” (Mashiach), isto significa
que adoração ao Mashiach deve ser repensada... Reverencia, respeito, honra são
manifestações aceitáveis, mas adoração...? Até porque nas instruções sobre os
ungidos em D’varim (Deuteronômio) 17.14-20 (reis); 18.1-8 (sacerdotes e
levitas) e 18.15-22 (profetas), não há nada que indique o menor sinal de uma
“adoração”, muito pelo contrário! Há uma séria advertência nos versos 9 ao 14
para que Israel não fosse como as outras nações e considerando que algumas
poucas nações mesopotâmicas e também o Egito, consideravam seus reis como
divindades, fica a forte impressão de tal coisa não deveria ser repetida pelos
hebreus. Contudo, qualquer conclusão deve ser muito bem examinada antes de ser
exposta. “Não devemos jogar fora o bebê junto com a água suja...”
Um livro perdido?
No passuk (versículo) 14 temos uma informação intrigante:
“Por isso se diz no livro das guerras do SENHOR: O que fiz no Mar
Vermelho e nos ribeiros de Arnom, e à corrente dos ribeiros, que descendo para
a situação de Ar, se encosta aos termos de Moabe.” (Bamidbar/Números
21.14-15)
Seria o livro das guerras de YHWH um livro perdido? Quais os
milagres feitos nos rios de Arnon e nas correntes dos rios no território de Ar?
Segundo Rashi (Rabi Shlomo Yitschaki, 22 de fevereiro de 1040 – 13 de julho de
1105), um dos maiores comentaristas da Torah, o ocorrido foi o seguinte:
O que aconteceu no Arnon foi que o povo de
Sichon se escondeu nas cavernas que havia nas duas ladeiras dos montes, entre
os quais se achava o estreito vale de Arnon. Os israelitas deviam passar por lá
e os amorreus iam massacrá-los. Porém, quando os israelitas chegaram ao cume do
monte para descer o vale, os dois montes se juntaram e os inimigos de Israel
que estavam nas ladeiras, foram esmagados sem que os israelitas percebessem.
Entretanto, depois que os montes se juntaram e os israelitas passaram, os
montes se juntaram e os israelitas passaram, os montes voltaram a sua antiga
posição e o rio do vale arrastou o sangue e os membros dos corpos dos inimigos
esmagados. Foi então que os israelitas compreenderam o grande milagre e
cantaram um cântico ao famoso poço de água (que segundo o Midrash,
acompanhou-os durante os quarenta anos que estiveram no deserto), pois foi por
meio deste os israelitas tomaram conhecimento do milagre ocorrido. (Fonte:
“Torá. A lei de Moisés” Ed. Sefer)
Considerações finais.
Diante de todas as informações aqui citadas, nos resta
estudarmos com diligência e imparcialidade para que possamos conhecer as
maravilhas da Lei do Eterno e desfrutarmos da paz abundante como disse o
salmista:
“Muita paz têm os que amam a tua lei, e para eles não há tropeço.”
(Tehilim/Salmos 119.165)
Shabat Shalom !!!
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