Por Yochanan ben Avraham
Introdução.
Neste penúltimo perek (capítulo) do Sefer Bamidbar (Livro de Números) mais
uma importante instrução aos filhos de Israel é dada, assim como o perek anterior, as palavras do Eterno revelam que a conquista da terra
prometida estava mais próxima. Podemos observar que as questões agrárias já
estavam bem definidas na mente do povo e certamente isso iria evitar confusões
no momento da partilha da terra... O que já nos ensina algo precioso:
Organização e planejamento antes de agir.
A consciência de que somos irmãos, decreta o fim das
desigualdades.
Israel na verdade é uma grande família, tão grande que por
multiplicar-se tanto, nos tornamos na grande maioria dos casos desconhecidos um
dos outros. Com isso perdeu-se vínculos, intimidades, semelhanças e até mesmo
tolerância. Porém, nos primórdios de nosso povo ainda havia esta proximidade
familiar, havia a consciência de que o membro de outra tribo era na verdade um
primo e - salvo uma terrível desconsideração pessoal e dureza de coração -
ninguém ficaria insensível as eventuais dificuldades que um familiar pudesse
enfrentar.
Cada tribo iria receber sua terra, exceto uma, a tribo de
Levi. Para esta tribo, sua porção era o serviço ao Eterno, mas ela era composta
por seres humanos de carne e osso com necessidades naturais e seria um erro
crasso pensar nos leviim (levitas) como uma espécie de seres etéreos ou algo
parecido. Sendo assim, o que fazer com quase cinqüenta mil pessoas (segundo o censo
de Bamidbar 26.62)? Como alojar tanta gente? Caberiam todos eles dentro do
Mishkan (Tabernáculo)? Certamente não, e essa situação trás consigo outra
grande lição para nós, pois O Eterno determinou que cada tribo deveria conceder
aos seus irmãos levitas, parte de sua herança para que estes pudessem habitar,
plantar...Enfim, viverem sua vidas.
O princípio a ser observado é: como os demais israelitas
poderiam ficar em paz nas suas casas, com suas lavouras e etc. Se seus irmãos
levitas não tinham onde habitar? Agora para um pouco e olhe ao seu redor. Uns
com tanto e outros sem nada, e quem deveria minorar as diferenças, pouco (ou
nada) se importa com as desigualdades sociais! A Torah em sua beleza e ética,
já aplicava a justiça social e combatia as desigualdades sociais com suas
palavras. O Eterno ordenou que quarenta e oito cidades fossem dadas aos levitas
e considerando a população aproximada desta tribo, teríamos cerca mil e
quarenta e dois habitantes por cidade.
Demonstrando justiça e misericórdia.
Das quarenta e oito cidades levitas, seis delas teriam um
propósito especial. Seriam um local de refúgio para aqueles que,
acidentalmente, tivessem cometido homicídio, assim ao irem para uma destas
cidades, estes “homicidas” não sofreriam a vingança por algum parente do
falecido. Deste modo, fica claro que o que O Eterno quer é misericórdia,
exatamente como o profeta Oshea veio confirmar:
Porque eu quero a misericórdia, e não o sacrifício; e o conhecimento de
Elohim, mais do que os holocaustos. (Oshea/Oséias 6.6)
É interessante pensar que estes potenciais homicidas
deveriam ficar nas cidades levitas, justamente no lugar onde pessoas envolvidas
com o serviço sagrado habitavam, teoricamente eram pessoas mais sensíveis às
questões espirituais, em que pese sua humanidade, deveriam estar impregnadas
pela atmosfera do mishkan e por isso, condicionadas a avaliar a situação e o
indivíduo sob outra perspectiva. Mais uma vez temos um exemplo de como devemos
olhar para aqueles que cometeram algum delito, ainda que tenha sido algo grave.
Mesmo não sendo levitas e não estando numa cidade refúgio, o
princípio serve para todos nós, pois os profetas Yeshayahu (Isaías) e Yermiyahu
(Jeremias) anunciaram palavras que evocam uma exposição àqueles que podem nos
ferir:
As minhas costas ofereci aos que me feriam, e a minha face aos que me
arrancavam os cabelos; não escondi a minha face dos que me afrontavam e me
cuspiam.
(Yeshayahu/Isaías 50.6)
Dê a sua face ao que o fere; farte-se de afronta.
(Eichah/Lamentações 3.30)
Diante dos textos acima descritos e analisando seus
contextos, entendemos o porquê das palavras de Rabi Yeshua HaNetsari:
Eu, porém, vos digo que não
resistais ao homem mau; mas a qualquer que te bater na face direita,
oferece-lhe também a outra;
(Matitiyahu/Mateus 5.39)
A questão é simples, desde os tempos da peregrinação no
deserto, O Eterno implantou uma lei onde a misericórdia deveria ser manifesta.
As cidades de refúgio demonstrariam tal virtude, mas com o passar do tempo os homens
se tornaram juízes vingativos, pronto a sentenciar a morte antes de ouvir as
partes envolvidas, e as palavras de Yeshayahu, Yermiyahu e Rabi Yeshua dão
outra direção, nos remetendo, de certa forma, as cidades de refúgio. Oferecer a
“face” a alguém que feriu a outro ou mesmo nós, pode parecer tolice aos mais
afoitos, mas demonstram o caráter misericordioso do Eterno talhado em nossos
corações.
Conhecendo as cidades de refúgio.
No sefer Yehoshua (Livro de Josué), temos os nomes das seis
cidades designadas como refúgio:
Então designaram a Kedesh em Galil, na região montanhosa de Naftali, a
Shechem na região montanhosa de Efraim, e a Kiriat-Arba {esta é Hebrom} na
região montanhosa de Yehudá. E, além do Yarden na altura de Yericho para o
oriente, designaram a Betser, no deserto, no planalto da tribo de Reuven a
Ramot, em Gilead, da tribo de Gad, e a Golawn, em Bashan, da tribo de Menashe.
Foram estas as cidades designadas para todos os filhos de Israel, e
para o estrangeiro que peregrinasse entre eles, para que se acolhesse a elas
todo aquele que matasse alguma pessoa involuntariamente, para que não morresse
às mãos do vingador do sangue, até se apresentar perante a congregação.
(Yehoshua/Josué 20.7-9)
Ao analisar o significado do nome das cidades refúgios a
algumas relações deles provenientes, percebemos que para aquele que estava sob
a ameaça do vingador, encontrá-las era um verdadeiro refrigério, Vejamos:
- Betser = Fortaleza remota.
- Gilead = Bálsamo; cura. (ver Yermiyahu 8.22)
- Golawn = Capa; Manto.
- Kedesh = Santo; santidade.
- Shechem = Ombro.
- Chevron = Ser reunido; ter comunhão.
Concluindo.
Após todo o tratamento recebido numa cidade de refúgio, a
pessoa só poderia sair deste acampamento e estar “livre” do vingador do sangue,
após a morte do Cohen gadol (sumo sacerdote) que foi ungido com óleo santo.
Estaria a Torah indicando que a morte de um ungido
(Mashiach), seria o que determinaria a libertação da culpa ou apenas um sinal
que indicaria um novo tempo? Fica a pergunta para nossa reflexão.
Shabat Shalom!!!
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